Filha de pais desportistas, com aptidão para a modalidade que é rainha na Costa Verde, Rita Brandão é a capitã da equipa de voleibol da Académica de Espinho (AAE), mas não esconde o amor pelo seu ‘espinhinho’. No arranque desta época, trocou os clubes da cidade, desde logo por motivos profissionais, mas também em última homenagem ao seu avô, Vladimiro, que há um ano nos deixou, e que revisita com carinho nesta entrevista.

Rita, não sei se é a melhor pergunta para início de conversa, mas tens o apelido Brandão. É um peso acrescido ser filha de pais atletas, sobrinha e neta de um dos maiores de todos os tempos do hóquei em patins?
Nunca senti nenhum tipo de pressão por causa do meu apelido. Mas sabes o que senti e ainda sinto todos os dias? Um orgulho imenso. Isto porque o meu tio, o meu avô e o meu pai sempre me acarinharam bastante e nunca me fizeram sentir que tinha algo a provar. Se eu conseguir fazer um vigésimo do que eles fizeram no desporto, para mim é motivo de orgulho. Cresci a ouvir mil e uma vezes as histórias do meu tio e do meu avô, que me faziam sentir como se estivesse a ver o meu avô a jogar ou a treinar a equipa do FC Porto no tricampeonato ou a tornar o Vitor Hugo no melhor de sempre – ele tinha um carinho enorme pelo Vitor, como se fosse mais um filho. Ainda tive a sorte de ver o meu pai jogar e de ouvir também as histórias de alguns momentos que o marcaram, e o mais bonito deles foi a época de campeão nacional pela AA Espinho. Dá para sentir todo a carinho e amizade que ele tinha por essa equipa. Por isso, pressão nunca, orgulho constante.

O desporto sempre fez parte da tua vida?
Sempre. A primeira vez que entrei num pavilhão foi com o meu avô na AAE. Ensinou-me a andar de patins quase antes de saber andar. Podia ter sido jogadora de hóquei, mas a minha mãe trocou as ideias ao meu avô. Aos 7 anos, o meu pai incentivou-me a começar a jogar voleibol e, a partir daí, nunca mais larguei o desporto. Acho que já nem consigo imaginar como teria sido a minha vida sem desporto, sem os treinos ao final do dia, sem as emoções do “balneário”…

Na escola, uma menina aplicada em todas as disciplinas ou tinhas algumas preferências?
Acho que tentei ser aplicada em todas disciplinas. Não percebo porquê, mas português era a disciplina que menos gostava. Sempre fui apaixonada pela matemática e pela física. Adorava e adoro números. Penso que este carinho pelos números ditou, em parte, a minha escolha pelo curso de engenharia mecânica na FEUP.

Dizem que o desporto nos traz competências para enfrentarmos o mundo do trabalho, principalmente, quando se lida com equipas de pessoas tão diferentes. Que qualidades te são inatas? Quais transportas do retângulo de jogo?
Francisco, não sei se sabes, ou pelo menos já ouviste dizer, o balneário de uma equipa feminina é um furacão de emoções – acho que todas as minhas antigas colegas vão concordar com isto. Quando, no início de uma época, alguém disser que vai ser tudo tranquilo, é uma grande mentira. Nos últimos cinco ou seis anos, tive a oportunidade de ser capitã de equipa e tive a responsabilidade de tentar ser um exemplo para as minhas colegas. Numa equipa, todas são diferentes, cada uma tem mil problemas e encara-os de forma completamente diferente. O meu grande desafio foi saber lidar com todas elas e de maneiras totalmente diferentes. Fez-me crescer bastante e fez-me ser uma pessoa mais sensata, tranquila e desenrascada. O saber lidar com problemas diferentes e escolhas difíceis é o meu dia a dia profissional como engenheira de produção. Toda a gestão que tinha de fazer no balneário é semelhante aos meus desafios profissionais diários.

Conheci-te há uns anos, quando o teu avô foi homenageado numa Gala do Desporto. Consegues traduzir em palavras o que sentiste quando a Nave Polivalente o acarinhou?
Voltando à primeira pergunta. Senti orgulho. Eu sei que a maioria das pessoas conheceu o meu avô como um grande homem e atleta. Eu tive a oportunidade de conhecer uma outra versão dele. O meu ‘vô’. A pessoa que mais gostava de mim neste mundo. A pessoa que fazia tudo por mim. A pessoa que só me queria ver feliz. Devo ter sido das únicas pessoas com quem ele nunca gritou dentro do rinque de hóquei da AAE. Eu tive acesso a um Vladimiro Brandão que mais ninguém conheceu, acho que nem mesmo a minha mãe nem o meu tio. Por isso, na maioria das vezes, eu olhava para ele apenas como o meu avô e não como um dos maiores atletas da nossa cidade. Lembro-me bem dessa homenagem na Nave. Foi um dos momentos que me fez cair a ficha, fez-me realmente perceber a magnitude dele. Milhares de pessoas de pé a bater palmas ao meu avô. Arrepio-me só de me lembrar.

Rita recorda com saudade as idas ao pavilhão com o avô, Vladimiro, para aprender a patinar – Foto: DR

Francisco Azevedo / Focal Point

Entrevista completa disponível na edição de 15 de abril de 2021 do jornal Defesa de Espinho