12 resoluções irrevogáveis para lá de março

Quanto tempo duram as vossas resoluções de Ano Novo? Três meses? Até ao fim de janeiro? Nem uma semana? E porque é que aquilo que pedimos ao engolir as 12 passas é sempre em maior número do que o que prometemos? Porque é que queremos ter mais do que o que damos? Aqui vão 12 resoluções de Ano Novo totalmente aleatórias, sem qualquer tentativa de hierarquização, e que, espero eu, possam tornar isto mais fácil para todos, mais respirável até.

“Eu [inserir nome, cargo, responsabilidade, designação de órgão de comunicação social ou partido político, ou qualquer outro fator que vos identifique perante a sociedade] prometo que, em 2022, vou:

  1. Votar nas legislativas. Começamos por uma resolução fácil e que fica já resolvida este mês. Claro que ninguém está 100% satisfeito com o orçamento apresentado, mas não estaríamos quer fosse de esquerda, quer de direita. Sejamos pessoas que se informam e fazem o seu papel. Um governo estável é o mínimo para o que podemos contribuir. Depois, sim, temos legitimidade para as queixas e pedir contas.
  2. Deixar de achar que tenho que ter opinião sobre tudo. E pior: que tenho de a partilhar com os outros. Sim, eu até assisti ao debate, vi o filme, até sei onde aquela celebridade passou as férias, até estou a par da última “polémica”, mas não tenho que comentar tudo nas redes sociais para que toda a gente saiba a minha opinião. Opinamos sobre tudo e, principalmente, sobre todos. Admitamos que praticamente ninguém quer saber da nossa opinião (só estou neste espaço porque me convidaram, não acredito que tenha algo de importante a dizer, na verdade).
  3. Dizer mais vezes “Não sei”. Eu não sei tudo o que se passa, não vejo as notícias todas, não sei se é melhor vacinar as crianças ou não, não sei se estamos numa endemia, se devemos optar pela dita imunidade de grupo ou fechar tudo e todos. Eu, Cláudia, não sei, sou ignorante em muitos assuntos. E tudo bem. Mais vale um “não sei” honesto do que uma resposta infundada.
  4. Deixar de dar palco a extremistas, negacionistas, populacionistas, fascistas e afins. Não discutir, não partilhar nem que seja para desmentir. Não dar hipótese ao clickbait. Não é vencê-los ignorando que existem, é não pactuando da disseminação das suas ideias.
  5. Ter verdadeira atenção para com pessoas com problemas de saúde mental. No comboio, entra muitas vezes uma senhora com claras perturbações mentais: canta alto, tem conversas com pessoas que não estão ali, parece viver num mundo de fantasia. Se não a visse quase todos os dias da mesma forma, diria que estava bêbeda. E tantos no comboio comentam, riem, pedem que se cale, reprimem, ou simplesmente reviram os olhos. A senhora tem um distúrbio e isso “incomoda” a nossa vidinha mais do que devia. E a vida dá tantas voltas que ninguém está livre de vir a ser aquele que “incomoda”.

“Dar valor às pessoas anónimas. Glorificar menos celebridades e ouvir as histórias dos ditos comuns porque é lá que estão os detalhes essenciais de uma sociedade”

  1. Dar mais a quem tem menos. Parece uma frase feita, mas tem uma consequência mais eficaz do que soa. Penso muito nisto desde que comecei a acompanhar o “Diário de um sem-abrigo”, publicado num jornal online muito interessante, “A Mensagem de Lisboa”. Jorge Costa era sem-abrigo e descrevia, entre tantas experiências que iam para lá da minha compreensão enquanto pessoa privilegiada, como um cigarro ou uma moeda mudavam o seu ânimo para o resto do dia. “Um cigarro era o único conforto que eu tinha por vezes. Outros, como o Zé, usam o vinho como anestesia. O vinho por vezes consegue secar as lágrimas e ajuda a dormir”. Vai tirá-los daquela situação? Não vai. E se eles forem gastar tudo em vinho, o que tenho eu a ver com isso?
  2. Ser mais como os animais. Sim, é mesmo isso. Esta resolução surgiu-me no ano passado quando estava a fazer o Caminho de Santiago. Fiz uma das etapas acompanhada de um cão e, como o Caminho dá para perceber coisas que o dia a dia não permite, apercebi-me como é a sua inocência que os faz felizes. É o não desconfiar de ninguém, o receber o que lhes damos sempre com entusiasmo, o não serem vingativos e o olhar para tudo, mesmo para as dificuldades do Caminho, como sendo uma festa que os faz ter uma passagem leve por esta vida. Em 2022, que saibamos ser mais puros e ver o mundo com mais inocência.
  3. Dedicar menos atenção a discussões com zero de substância. Que é como quem diz, sobre futebol. Andamos a matar a paixão pela coisa. Em 2021, a comunicação social ainda me conseguiu surpreender com o tanto que tinha a dizer (ou a repetir) sobre a saída de um determinado treinador de futebol de um determinado clube. Daqui para a frente prometemos dedicar minutos e páginas a coisas com maior importância para a vida das pessoas a ver se elas param de dizer que a comunicação social já não é o que era.
  4. Dar valor às pessoas anónimas, que realmente fazem o mundo girar. Glorificar menos celebridades e ouvir as histórias dos ditos comuns porque é lá que estão os detalhes essenciais disto de fazer parte de uma sociedade. Sabiam que há um senhor a viver sozinho numa aldeia e não necessariamente porque quer? O José Ferreira, de Casas da Serra, tinha o sonho de ir ao Dragão. Alguém leu a sua história e levou-o, e a imagem dele emocionado no FC Porto – SL Benfica conta mais que todos os pontos e todas as goleadas possíveis. Já agora, o José Ferreira só vai assistir ao futebol ao café na aldeia vizinha quando o jogo não é à noite, para não voltar sozinho. E se 2022 fosse o ano em que deixamos de fazer jogos a horas absurdas da noite? A pensar nas pequenas felicidades das pessoas anónimas.
  5. Parar mais vezes. Deixar de dizer “não tenho tempo”, “tenho trabalhado imenso”. Este vai ser o ano em que vamos parar um bocadinho mais todos os dias para fazer menos daquela lista de afazeres que nos mostram produtivos, úteis, responsáveis aos olhos dos outros. Vamos fazer nada mais vezes. Deixar de vangloriar as vidas ocupadas e, acima de tudo, de pôr rótulos nas pessoas conforme o que é o seu emprego. Eu sou mais do que a minha profissão, o estatuto que ela me traz ou onde me leva nas férias.
  6. Pensar em quem faz as coisas que consumo desenfreadamente, escudado pela justificação da necessidade. Em 2022, vamos perceber que não precisamos de comprar tantas coisas e que, as que precisamos verdadeiramente, podem vir de lojas e marcas mais conscientes com as pessoas e o ambiente.
  7. Fazer por que estas resoluções sigam convictas para lá de março, onde se perdem as promessas que fazemos de irmos, efetivamente, ao ginásio e enquanto acreditamos que tudo vai ser melhor. Que vamos ser melhores. Assim pode ser que não cheguemos a dezembro a querer muito que o ano de 2022 termine finalmente. Porque, na verdade, fizemos por ser um bom ano.

Cláudia Brandão
Jornalista