Foto: Francisco Azevedo

Jorge Pina vive em Espinho desde 1974 e tem 73 anos. Foi aqui que se fixou depois de uma experiência de vida difícil em Moçambique, onde esteve mobilizado para a guerra colonial. Apegou-se à vida espinhense e assume que tem feito tudo o que pode pela terra, sem arrependimentos, incluindo a longa experiência na Assembleia Municipal, como vogal eleito pelo PS, ainda que sem militância.  

Foi o serviço militar forçado em Moçambique ou a música que marcou o trajeto de vida? 

Naquela altura havia a guerra colonial e eu já tinha algum cadastro político pelo facto de cantar. Nunca me arrependo daquilo que faço. Cantava canções revolucionárias. Era contra a guerra, mas tive de ir para a guerra. 

A juventude vivida na Guarda dava azo aos sonhos da vida, mas a mobilização para a guerra colonial fê-lo amadurecer mais cedo…     

Depois do liceu, matriculei-me no Instituto Superior de Psicologia Aplicada, mas o curso não era então considerado superior. Ainda procurava um rumo profissional quando fui à inspeção militar. Éramos 20 e tal mancebos, dos quais 80% piraram-se para França. Entretanto, tinha-me acontecido uma desgraça aos 17 anos, que foi a perda do meu pai. Passou-me muitas vezes pela cabeça também a hipótese de me pirar. E até cheguei a pirar-me, mas logo regressei. A minha mãe era doméstica e a minha irmã preparava-se para ingressar no ensino universitário. Entendi que devia ajudar a minha mãe na educação da minha irmã com o dinheiro que ganhasse na tropa. Não seria muito, mas, sendo pouco, ajudava. E assim lá fui eu para o serviço militar. Mas passados 20 meses tive de ir para Moçambique. Aquilo foi uma canalhice, mas fui. Estive no norte de Moçambique e depois fui para a província de Tete, onde havia a chamada “guerrilha acesa”. 

A vida estava em risco?! E ainda há sequelas… 

Fiz parte do pelotão de defesa imediata na barragem de Cabora Bassa e também das colunas militares nas zonas de Tete. Foi, então, que fui ferido numa mina. Fui transportado para Lourenço Marques, que agora se designa por Maputo. Foi muito duro. Basta imaginar um jovem de 22 anos estar todo tapado na cabeça e pensar que ia ficar cego. Tenho uma grande dívida de gratidão à minha mulher. Como namorada, nunca me largou e hoje estamos juntos. Ela tinha uma autorização especial para me visitar. Era professora do 1.º ciclo e eu conhecia-a daqui, porque os nossos pais eram da mesma aldeia.  

Experienciou uma mescla de pesadelo e sonho? 

A minha mulher tinha e tem um coração do tamanho do mundo e também ajudava os meus colegas que estavam sem pernas ou braços. O cirurgião Castro Reis, que também nunca esquecerei e é cá de Espinho, operou-me com êxito. 

Reportagem disponível, na íntegra, na edição de 07 de julho de 2022. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro por apenas 32,5€.