Soube pela comunicação social que o Município de Espinho aderiu ao projeto nacional dirigido à comunidade escolar, que se integra na operação “cidades integradoras”.
“Ubuntu no Bairro – Espinho, Terra e Mar” tem como objetivo facilitar o desenvolvimento socioeducativo de crianças, jovens e restante comunidade para a intervenção comunitária. Uma boa causa, um bom investimento. Assim, estão planeadas um conjunto de atividades destinadas à comunidade e aos alunos dos dois agrupamento. A grande missão é divulgar a filosofia ubuntu e fazer com que os seus valores perdurem nas relações interpessoais.
Sobre esta filosofia da qual sou aderente. já escrevi várias crónicas e volto hoje à filosofia milenar, de origem africana, cuja mensagem é um alerta para a necessidade de se praticar uma ética social. O estudo desta ética social e humanitária tem suscitado muito interesse e leva-me a contar-vos uma história relatada por um antropólogo que estudava, então, o funcionamento da vida coletiva de uma tribo africana – ubuntu como uma filosofia de vida.
Um dia, ao final da tarde e para desanuviar um pouco, propôs às crianças da aldeia um jogo: teriam de correr até uma árvore lá bem longe e o mais veloz seria o vencedor e ganharia um cesto cheio de doces. No momento decisivo com a palavra “Partida”, aconteceu algo inesperado : as crianças deram as mãos e correram juntas até à meta. Todas estavam felizes!
Qual seria o interesse de só uma ganhar, diziam elas. Porque não partilhar os doces e comemorar em conjunto? Que bela lição de vida!
Na verdade, os avanços civilizacionais foram enormes e excelentes como os alcançados pela ciência e tecnologia, mas em contrapartida, perderam-se as ligações e o espírito coletivo. Assustadoramente, parece ter vencido o individualismo atroz e a implementação da ideia do salve-se quem puder! Neste novo mundo, o ser humano parece ter feito apagão destes conceitos de ancestralidade sábia e lançou-se, seguro e ambicioso, em guerras pessoais e coletivas, no seu bairro, na sua comunidade, no seu país, em guerras sucessivas pelo poder, em atrocidades constantes e violadoras dos direitos humanos e do ambiente, com uma postura de desafio constante à sustentabilidade do planeta.
Este plano de ação terá sucesso? Ira gerar mudanças? Claro que temos de acreditar que estas sementes lançadas e trabalhadas num determinado espaço de tempo tenham fortaleza suficiente para fazer emergir comportamentos onde os valores da empatia, do respeito, da solidariedade e da noção da prevalência do coletivo prevaleça sobre o individualismo. Uma sociedade civilizada tem de se reger por valores. É desejável uma aprendizagem nesse sentido embora eu não acredite em programas pontuais, quando estão em causa mudanças de atitudes que são essencialmente estruturais. Para tal, é preciso um trabalho contínuo e alargado no tempo. Se muitas sociedades foram e são seguidoras desta filosofia de vida é porque ela foi muito trabalhada e passou de gerações para gerações. Tarefa seguramente difícil, árdua, envolvente, persistente, mas nada como tentar. Desejo os maiores sucessos na implementação deste projeto.
Arcelina Santiago
Professora