REPORTAGEM. Há duas décadas havia quatro companhas na arte xávega em Espinho e atualmente sobrevivem duas, a de Adelino Ribeiro e a de José Barros (Zé Gordo). A atividade movimenta mais de duas dezenas de pescadores, mas está em risco de desaparecer. Os testemunhos dos patrões das companhas e pescadores sublinham a falta de apoios a uma arte que poderá estar voltada para o turismo e que atravessou um terrível período de pandemia.
A pandemia trouxe dificuldades acrescidas à arte xávega, uma pesca que tem tendência a extinguir-se. Adelino Ribeiro, com 67 anos, é o proprietário de uma das duas companhas (Nélson e Sérgio) e tem como sua atividade principal o comércio do peixe, desde 1977. Há 21 anos, arrojou-se e, “por brincadeira”, passou de comerciante a pescador. A mãe e a sogra já se dedicavam à venda de peixe e isso inspirou-o a entrar no negócio da arte xávega, que em tempos idos era lucrativo. Atualmente, nenhum dos seus descendentes pretende assegurar este negócio. Seus filhos têm os seus trabalhos e só admitem, um dia, pegar na arte xávega no âmbito de um projeto turístico. “Comprei esta companha por brincadeira. Na altura havia quatro companhas e comprei-a ao Zé Nuxa. Desde sempre gostei deste ambiente e da pesca da arte xávega e sempre estive ligado ao comércio do peixe. Achei, também, que com esta companha seria uma mais-valia para a minha atividade principal. Muitas vezes dizia que um dia compraria uma companha e, assim, não teria de comprar peixe a ninguém”, contou Adelino Ribeiro como tudo começou.
O investimento numa companha é elevado e deverá rondar os 100 mil euros. Há um conjunto de encargos inerentes, nomeadamente seguros que são muito dispendiosos. “É importante ter-se um bom seguro porque esta é uma atividade de risco para os pescadores”, acrescenta.
“Fiquei sem duas redes, o que corresponde a um prejuízo de cerca de 25 mil euros!”
José Barros (Zé Gordo) é o proprietário de outra das companhas de Espinho, a ‘Vamos andando’. Tem a companha há cerca de 20 anos que comprou-a a um outro pescador chamado Borges. “A arte xávega está parada em virtude do defeso e da pandemia e, brevemente, irei marcar a vistoria para que possamos voltar ao mar”, disse-nos José Barros, com um brilho nos olhos, olhando para a sua embarcação que estava pintada e pronta para enfrentar as ondas do mar de Espinho. “Mas como estão as coisas, não vejo que a arte seja para continuar. Estive para fechar no ano passado, mas os ‘camaradas’ (pescadores) pediram-me muito para que não o fizesse. Comprometi-me em pôr o barco a trabalhar e fiz a vontade aos ‘camaradas’, mas aguardamos poder voltar a trabalhar. Já são muitos meses”, lamenta José Barros pensando que são cerca de uma dezena de pescadores que trabalham consigo e que vivem, exclusivamente, da pesca da arte xávega. “Todos estão parados. Querem trabalhar e não podem! Esperemos poder voltar ao mar em abril”, acrescenta.
Também José Barros lamenta não haver quaisquer apoios para a arte xávega. “Nem do estado, nem da Câmara! Precisávamos que nos apoiassem na compra de material. Só no ano passado, nessa área, tivemos muito prejuízo. Fiquei sem duas redes, o que corresponde a um prejuízo de cerca de 25 mil euros! Foi por isso que tinha tomado a decisão de, este ano, não voltar a formar a companha. No ano passado tivemos muitos lances só com algas! E isso danificou as redes. Espero que isso não se repita este ano! Seria fatal”…
Artigo disponível, na íntegra, na edição de 18 de março de 2021. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro, a partir de 28,5€.