Retrato de uma geração pouco feliz?

Uma investigação pioneira em Portugal, dinamizada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos, resultou na publicação do Estudo ‘Os Jovens em Portugal, Hoje’, editada recentemente em Novembro, apresentando um retrato sobre a forma como os jovens se relacionam e como encaram o trabalho, entre muitos outros aspectos.

De acordo com dados do INE/Pordata, cerca de 1/5 da população portuguesa é constituída por jovens que têm entre 15 e 34 anos, representando 21,5% da população residente. São mais de 2,2 milhões os jovens que se encontram nesta faixa etária.

Entre os jovens representados pela investigação, o estudo conclui que o mais habitual é já terem terminado os estudos (58%), pese embora, entre aqueles que concluíram os estudos, quase metade (46%) deixaram de estudar ao completarem o ensino secundário ou pós-secundário.

Os motivos sinalizados pelos jovens que decidem frequentar o ensino superior mantêm-se muitíssimo estáveis entre os que já completaram e os que ainda se encontram a frequentar, surgindo no topo duas grandes razões: «para conseguir um melhor posto de trabalho» e para «ter um salário melhor».

Sendo estes os dois grandes motivos apontados, existem pequenas diferenciações. «Conseguir um melhor posto de trabalho» é o motivo referido por 69% dos que estão agora a frequentar o ensino superior, face a 67% dos jovens que já o concluíram, e para «ter um salário melhor» representa 63% face a 54%, ou seja, os jovens que frequentam actualmente o ensino superior têm expectativas mais elevadas do que os motivos apontados por aqueles que já concluíram.

Complementarmente, entre nove aspectos referenciados na sinalização da relevância atribuída ao «emprego ideal», aquele que surge em primeiro lugar (26%), e o que é citado por 66% dos jovens numa das três primeiras posições de razões, é «ter um bom salário», sendo a questão mais importante e valorizada.

Porém, no que se refere ao valor dos rendimentos, perto de três quartos (72%) auferem rendimentos que não ultrapassam os 950 euros líquidos por mês, com 23% dos jovens (cerca de 1/4) a auferirem rendimentos até 600 euros e 30% auferem rendimentos um pouco acima ou abaixo do salário mínimo nacional.

O estudo evidencia também que mais de um terço dos jovens com rendimentos (39%) declararam que é difícil ou muito difícil viver com o rendimento que dispõem. 42% referem que o rendimento actual «dá para viver» e apenas 19% dos jovens sinaliza que o rendimento actual de que dispõem lhes permite viver confortavelmente.

Por outro lado, dados da publicação ‘A Equidade Intergeracional no Trabalho em Portugal”, um estudo apoiado pela Fundação Calouste Gulbenkian, permitem concluir que as gerações mais novas duplicaram o número de anos de escolaridade, mas que a recompensa salarial por cada ano adicional de escolaridade é cada vez menor.

Ou seja, o factor educação e qualificação, um catalisador do crescimento económico e um forte estímulo à mobilidade social, tem vindo a ter um contributo menor para as gerações mais jovens.

Constata-se assim que o factor educação e qualificação dos jovens, sendo um elemento decisivo para a competitividade económica e factor determinante para a geração de postos de trabalhos qualificados e geradores de rendimentos de valor acrescentado, não tem evoluído de forma a permitir o aumento do nível de rendimentos dos jovens, nem tem promovido a diferenciação salarial motivadora à obtenção de melhores qualificações e competências, que fomente decisivamente a mobilidade social dos cidadãos, contribua para a equidade e coesão sociais e para o bem-estar dos jovens.

Com efeito, com base nos dados do INE/Pordata, é possível concluir que nas duas últimas décadas se tem verificado um esmagamento no nível salarial dos portugueses, com uma menorização da diferença existente entre o salário mínimo nacional e o salário médio: o salário mínimo nacional cresceu 72%, de 348 euros em 2002, para 600 euros em 2019, enquanto o salário médio cresceu apenas 47%, de 685 euros em 2002, para 1 005,61 euros no ano de 2019.

Regressados ao estudo, no que se refere à realização dos jovens com o trabalho, este conclui que o mais comum é que os jovens se sintam pouco satisfeitos com o seu trabalho pago (40%) e que, entre os que se sentem insatisfeitos, o mais habitual é terem pensado deixar o trabalho, acabando por decidir não o fazer em 39% dos casos, resultando, no nosso dizer, num elevado nível de insatisfação dos jovens na sua relação com o trabalho.

“Os jovens maioritariamente (52%) encontram-se insatisfeitos, aborrecidos e desiludidos perante o trabalho, não se sentindo realizados profissionalmente”

Tomando em consideração duas informações relativas ao trabalho pago (a satisfação que os jovens sentem e a posição face a ele), o estudo classifica os jovens em três tipos: os «aborrecidos», porque não se sentem satisfeitos no trabalho e todos os dias pensam em deixá-lo (23%); os «desiludidos», onde se incluem os jovens com satisfação muito baixa, que não pensam diariamente em deixar o trabalho; os jovens com alguma satisfação, que chegaram a pensar em deixá-lo mas decidiram não o fazer; e os «realizados» (48%), onde se incluem todos os restantes.
Assim se conclui que os jovens maioritariamente (52%) encontram-se insatisfeitos, aborrecidos e desiludidos perante o trabalho, não se sentindo realizados profissionalmente.

Dos dados emergentes do estudo, permite-se concluir igualmente que 30% dos jovens teriam máxima disponibilidade de mobilidade para o estrangeiro, referenciado que teriam a certeza de que iriam viver para o estrangeiro.

O estudo analisa ainda até que ponto se cumpriram as expectativas que os jovens tinham relativamente à vida e grau de felicidade com a mesma. O mais comum é que o grau de cumprimento das expectativas que os jovens tinham relativamente à vida se situe nos níveis «abaixo» ou «muito abaixo» das expectativas: acontece a 38 % dos jovens, ou seja, dois em cada cinco jovens entende que a sua vida está muito aquém ou aquém das expectativas relativamente à sua vida.

Não será assim surpresa concluir que, em função do que declararam sobre o grau de felicidade que sentem com a sua vida, 60% dos jovens não se declarem felizes: mais de um terço dos jovens (34%) se tenha declarado que se sentem poucos felizes com a sua vida e 26% «quase felizes».

Escrito em desacordo ortográfico.

Tito Miguel Pereira
Consultor