Também tu Europa!?

No dealbar do milénio, no ano de 2000, os Chefes de Estado e de Governo da União Europeia aprovaram o objectivo estratégico para a União Europeia: tornar a economia europeia a mais competitiva do mundo até 2010.

No reconhecimento da perda de dinamismo e de posição da Europa face às economias desenvolvidas e às economias emergentes, o objectivo declarado na Cimeira de Lisboa, em Março de 2000, era tornar a União Europeia na economia baseada no conhecimento mais dinâmica e competitiva do mundo, capaz de garantir um crescimento sustentável, com mais e melhores empregos e com maior coesão social, num desígnio comum que veio a ser conhecido como Estratégia de Lisboa.

Uma década mais tarde, em Março de 2010, a União Europeia apresenta a Europa 2020: Estratégia para um crescimento inteligente, sustentável e inclusivo, no desenvolvimento de uma economia baseada no conhecimento e na inovação; numa economia mais eficiente em termos de utilização dos recursos, mais ecológica e mais competitiva; e numa economia com níveis elevados de emprego que assegure a coesão social e territorial.

No seu prefácio afirmava-se que ‘numa lógica de continuidade condenar-nos-ia a um declínio gradual e a ocupar um lugar de segundo plano na nova ordem global. Chegou o momento da verdade para a Europa. Temos de dar provas de audácia e ambição’.

Não obstante as palavras de motivação e de força, esta estratégia parece ser o reconhecimento do fracasso da anterior ou a desistência do objectivo global, porquanto o desígnio deixa de ser transformar a Europa na mais dinâmica e competitiva economia do mundo, mas “apenas” que a Europa ‘saia fortalecida da crise económica e financeira’.

Reconhecia-se assim, de certa forma, que a Europa não seria a economia mais competitiva e dinâmica do mundo, mas que o que era fundamental e determinante era alcançar ou assegurar um determinado patamar em que a Europa não se subalternizasse relativamente à nova ordem económica ditada pela globalização e o reforço do dinamismo, a crescente importância e relevância das economias emergentes, sobretudo asiáticas e mormente da emergência da China como um novo referencial económico mundial.

Sucede que a União Europeia, sendo um referencial de avanço político, social, de inclusão e coesão social e territorial para todo o mundo, o berço da civilização ocidental, na melhor acepção que lhe possamos assumir, o facto é que tem paulatinamente a ver-se arredada da preponderância económica mundial, vendo a sua posição fragilizar-se, primeiramente durante décadas relativamente aos Estados Unidos da América e ao Japão, e mais recentemente face à China.

A emergência da pandemia da COVID-19 parece ter demonstrado a menor resiliência da economia europeia face aos seus competidores

Do reconhecimento que na transição do milénio a Europa estaria em larga perda de protagonismo económico, verificando-se as suas perdas referenciais no dinamismo económico, no menor crescimento das economia, na menor produtividade do trabalho per capita face aos EUA, e no declínio do investimento, se verificando igualmente uma perda substancial na economia do conhecimento e da inovação, com a Europa a apresentar um pior desempenho na investigação e desenvolvimento face aos seus principais competidores, mormente os EUA e o Japão.

Nestas vertentes, e volvidas duas décadas a União Europeia parece incapaz de ombrear com os seus competidores tradicionais, numa perda em que todos se encontram agora, relativamente às economias asiáticas e face ao poderio económico e industrial alcançado pela China nas duas últimas décadas.

De acordo com o ‘World Economic Outlook’, publicado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI), a riqueza gerada na União Europeia, no período de 2002 a 2019, cresceu a um ritmo médio em linha com o ritmo de crescimento dos EUA, o que na verdade, lhe permite manter as distâncias não se aproximando efectivamente do dinamismo económico gerado do outro lado do atlântico, com um crescimento médio do produto interno bruto, per capita, em paridade de poder de compra, a preços constantes de 1,28% na União Europeia face a 1,26% nos EUA.

Neste ranking global, os dois referenciais económicos estão em perda relativamente a outras economias avançadas, com um ritmo de crescimento de 2,29% ao ano, e muito através das economias asiáticas emergentes com um crescimento médio anual de 6,64%, e muito aquém do crescimento médio anual de 8,45% evidenciado pela China.

Complementarmente, o European Innovation Scoreboard 2021, publicado pela Comissão Europeia, vem evidenciar que a União Europeia, no panorama global, tem uma performance de investigação, desenvolvimento e inovação mais positiva relativamente a países como a China, o Brasil, África do Sul, Rússia e Índia, mas que continua a apresentar uma performance inferior a países como a Coreia do Sul, Canadá, Austrália, Estados Unidos e Japão, países que lideram os referenciais de inovação e desenvolvimento em termos globais.

A emergência da pandemia da COVID-19 parece ter demonstrado a menor resiliência da economia europeia face aos seus competidores.

Com efeito, a economia europeia, abalada pela pandemia, apresentou um recuo acentuado no ano de 2020, com um decrescimento de 6,1%, face ao menor recuo registado nos EUA (-3,8%) e ao registado nas economias asiáticas emergentes que decaíram apenas 1,7%, que comparam com o crescimento positivo de 2,0% registado pela China no ano de 2020.

No sentido da recuperação, também parece ser menos dinâmica a economia Europeia, na retoma face às perdas provocadas pela pandemia. As projecções apontam um crescimento inferior para a União Europeia em relação aos seus competidores internacionais, com um crescimento de 4,9%, que compara mal com o crescimento de 5,7% apontado para os EUA, de 6,4% nas economias asiáticas emergentes e de 7,7% previsto para a China.

Face a esta panorama, a Comissão Europeia aprovou várias medidas com destaque para o instrumento NextGenerationEU e o Mecanismo de Recuperação e Resiliência, que em conjunto constituem aquele que é considerado o maior pacote de investimento alguma vez aprovado pela União Europeia, com níveis de investimento sem precedentes, disponibilizando 723,8 mil milhões de euros (a preços correntes) para apoiar as reformas e os investimentos efectuados pelos Estados-Membros.

Estes instrumentos visam ajudar a reparar os danos económicos e sociais imediatos causados pela pandemia da COVID, em consonância com as prioridades europeias, visando simultaneamente assegurar uma recuperação sustentável e inclusiva que promova as transições ecológica e digital.

Mas estaremos a tratar do futuro, ou apenas a fazer com que não percamos muito?

Tito Miguel Pereira
Consultor

Escrito em desacordo ortográfico