Jorge Teixeira foi professor de educação física durante 46 anos, uma das mais longas prestações no ensino espinhense, 39 dos quais na Escola Dr. Manuel Laranjeira. Esteve ligado ao voleibol do SC Espinho, o clube do seu coração, durante anos a fio e até desempenhou funções no futebol profissional, nomeadamente no Benfica, juntamente com Manuel José. Há três livros da sua autoria, nomeadamente O Voleibol do SC Espinho (2003), Espinho Balente (2004) e 100 anos é muito tempo (2015) que retratam muita da história dos tigres.

É espinhense de gema…
Eu e o meu irmão gémeo nascemos em Espinho há 66 anos, no hospital velho, o edifício que foi demolido na rua 8 e onde esteve a sede do Partido Comunista. Os meus pais não são de cá, mas a minha avó veio para Espinho com dois anos de idade. A origem da minha família é de gente ferroviária.

Como era Espinho na sua juventude?
Comparando com os dias de hoje, a minha geração praticamente não tinha nada. Mas se fizermos uma comparação àquilo que existia na altura com o resto do país, nós em Espinho já tínhamos muito. Tínhamos a possibilidade de praticar desporto porque já havia o futebol, atletismo, voleibol, andebol, natação, hóquei em patins e a ginástica nos principais clubes, o SC Espinho e a Académica de Espinho.
Além disto, havia cinema no Teatro S. Pedro e no Casino de Espinho e a Igreja era frequentada por muitos da minha geração que eram educados de forma tradicional, com a catequese onde se criavam grandes amizades e onde surgiam grupos por força de uma organização extraordinária que eram os escuteiros.
Por isso, desde muito jovens que tínhamos o privilégio de poder partilhar coisas em liberdade, mesmo num Estado Novo.
O Romeu Vitó e o Óscar Rodrigues, aos domingos de manhã, dedicavam-se ao entretenimento dos jovens espinhenses. Íamos para o Campo da Avenida, que era pelado, praticar ginástica sueca. Disponibilizavam esta prática desportiva de forma gratuita, todos alinhados e uniformizados, com uma ideia da Mocidade Portuguesa, mas sem efetivamente o ser. Estes dois senhores, apesar de serem comerciantes, queriam dar desporto aos jovens e foram os percursores da educação física em Espinho. Os professores apareceram mais tarde, nomeadamente o Geraldo Brandão, Américo, Torres, a Noémia e a Graça Guedes.
O futebol era um caso à parte e já fazia escola, com o Cântara, o Alcobia e outros a treinarem os jovens da minha idade. Mas a escola de ginástica é o ponto de partida para o desenvolvimento da prática desportiva em Espinho. Foi o clique para ir para o voleibol.

A sua participação como atleta foi só no voleibol?
Corria os corta-matos e o SC Espinho tinha uma secção de atletismo, fundada pelo saudoso Luís Torres e que tinha como treinadores o Beto e o Carvalho. Corríamos ao final do dia, nas ruas de Espinho e de Silvalde. Não tínhamos condições. Vestíamos, com grande orgulho, um blusão do SC Espinho e fazíamos as provas de estrada e os corta-matos. Íamos muitas vezes às provas de atletismo no Porto que eram feitas na pista de cinza do Estádio das Antas.
Posteriormente começámos a olhar para o Carlos Padrão, Rolando de Sousa, Válter Brandão e para todos esses campeões nacionais de voleibol. A ligação com uma bola, no desporto, é algo que atrai os miúdos. Aos 13 anos fui para o voleibol, como tantos outros jogadores dessa época e por lá andei até aos 20 anos. Quem tem unhas toca guitarra e percebi que não sendo nenhum mau jogador não teria as condições naturais para fazer parte de grandes equipas que o SC Espinho tinha. Fui jogador e treinador durante dois anos na Académica de Espinho. Depois, fui dar aulas para Santa Maria da Feira e tive aquelas funções no Orfeão da Feira. A partir dessa altura percebi que gostaria de ser treinador e o coração chamou-me para o meu lugar que era no SC Espinho. Fui para lá em 1977 para treinar o voleibol feminino e fomos campeões nacionais de juniores. Estive lá nos 20 anos seguintes a treinar escalões de formação e interinamente a equipa sénior masculina, que ficou sem treinador. Nessa altura, o Rolando de Sousa conseguiu convencer o José Moreira que não estava bem com o FC Porto.

Os tempos livres eram ocupados apenas com a atividade desportiva?
Íamos ao cinema ao sábado, ao Teatro S. Pedro e ao Casino de Espinho para assistirmos ao espetáculo de variedades. Na altura conseguíamos algum dinheiro e não falhávamos as duas sessões de cinema e aproveitávamos a ver o espetáculo de variedades e as bailarinas.
Ao domingo íamos ver o Espinho ‘Balente’ e ao sábado à noite o voleibol e o andebol. Fazíamos as nossas festas de garagem, mas nem sempre os grupos eram os mesmos. Não há ninguém da minha geração que não se lembre destas festas.
Sempre convivi com um grupo de amigos mais velhos. Foi nessa altura que começámos a aperceber-nos do que era a vida política. Tínhamos alguma dificuldade em nos reunir para partilhar ideias daquilo que era fora do âmbito do desporto ou da música.
Antes do 25 de abril estava no primeiro curso de instrutores de educação física e tínhamos professores extraordinários que tinham uma intervenção muito subtil e assertiva connosco, alertando-nos para as grandes questões sociais. Recordo-me dos professores Manuel Puga e Luís Falcão.

Sentiu alguma vocação política a partir daí?
Desde o 25 de abril que votei em três partidos diferentes, mas nunca fui filiado num partido político. Só fui a duas ou três sessões de esclarecimento de partidos políticos – a uma do PPD, no salão nobre da piscina, a uma sessão de esclarecimento do PCP no antigo pavilhão do SC Espinho e a uma outra do PS. Nunca participei em comícios, nem em manifestações, mas nunca deixei de lado a minha participação cívica naquilo que, enquanto cidadão, acho ser a minha obrigação.
Adoro política, gosto de conversar e de discutir política, mas nunca esteve nos meus horizontes estar embrenhado ou filiado em partidos. Fui convidado para fazer parte de projetos políticos em Espinho na nossa autarquia, mas rejeitei sempre. Gosto de ter o meu pensamento, de o discutir, de respeitar os outros e de manter a minha casmurrice. Gosto da política na sua forma mais pura.

Alguma vez sentiu que teria de intervir politicamente?
Fi-lo algumas vezes, nomeadamente na Escola Dr. Manuel Laranjeira, onde trabalhei durante 39 anos. A minha participação, quase sempre tinha a ver com política, nomeadamente com as políticas educativas, discutindo-as na sua essência.
Nunca levei para dentro do meu trabalho, assim como para o SC Espinho, qualquer ideia partidária. Não sou neutro, voto sempre nas eleições e tenho sempre a minha opinião. Esta é a minha obrigação de participação enquanto cidadão. Só assim podemos cobrar a quem nos dirige.

Entrevista completa na edição de 10 de novembro de 2022. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro por apenas 32,5€.