Manuel Barbosa Santos é natural de Espinho e tem 64 anos. Pai de oito filhos, é engraxador na rua 19, num quiosque que adquiriu há cerca de sete anos e que pertencia a um outro colega de profissão que o deteve durante décadas. Conhecido por Manuel Engraxador, aprendeu a arte com o seu pai, mas a sua profissão, até se reformar, foi na varredura e na recolha do lixo, primeiro no Município de Espinho e, depois, no Porto.

Por que razão decidiu dedicar-se a engraxar calçado?
Para mim é um hobby, uma forma de ocupar o meu tempo livre e de arrecadar mais algum dinheiro. Se estiver por casa acabo por gastar dinheiro e aqui, a fazer isto, até consigo poupar. Por outro lado, gosto de ajudar estes comerciantes que têm lojas aqui. Mesmo com a idade que tenho, não me importo de auxiliaras lojistas. Já tentaram assaltar a loja da Bijou Brigitte e consegui apanhar a senhora que furtou objetos.O mesmo numa casa de perfumes um pouco mais abaixo. Gosto de ser prestável.

O que o levou a ficar com o negócio que existia, há muitos anos, neste local?
Quando era miúdo, engraxava sapatos com o meu falecido pai que trabalhava no Costa Graça, na rua 22. Ao domingo, ele engraxava sapatos na esquina das ruas 3 com a 16, próximo do cemitério, para ganhar mais algum dinheiro para a família.

Eu passava imenso tempo com ele e aprendi a arte. O meu pai passava a graxa e eu tinha de passar a escova. Ele era muito exigente e não me deixava entregar o serviço ao cliente enquanto não estivesse em condições. Alguns dos seus clientes deixavam os sapatos para engraxar e, quando estavam prontos, ia a casa deles fazer as entregas. Entretanto, há cerca de sete anos, soube que este local estava vago e decidi ficar com ele. Falei com o senhor Silvério barbeiro que me indicou a pessoa que tinha deixado ficar este espaço.

Foi a mulher do falecido Bernardino que me deu a chave. Fui à Câmara Municipal e passei isto para o meu nome. Fiz uma caixa de engraxador e passei a engraxar sapatos neste quiosque. Os clientes vêm aqui, sentam-se e eu faço o meu serviço. São clientes de Espinho e até turistas estrangeiros.

O quiosque de Manuel Santos é um dos cartões de visita da rua 19. Fotografia: Sara Ferreira/DE

O quiosque onde trabalha tem um aspeto diferente. Era preciso um melhoramento do antigo espaço?
O espaço precisava de algumas reparações e a Câmara Municipal não as quis fazer. Entretanto, o dono da empresa Cavalinho propôs-me fazer um novo quiosque e apresentou-me três projetos. Gostei imenso de um deles e mostrei à proprietária da Sapataria Ana. Nunca me passou pela cabeça que iria colocar ali, junto à sua loja, publicidade a uma marca concorrente. Falei com o dono da Cavalinho, expliquei a situação e agradeci aquilo que queria fazer por mim. Entretanto, a proprietária da Sapataria Ana mandou cá um carpinteiro que remodelou este quiosque como eu pretendia e como se apresenta atualmente.

O negócio esteve, de facto, parado durante muito tempo e os clientes habituais deixaram de passar por cá. Fui fazendo a clientela com o meu trabalho

Este espaço esteve parado durante bastante tempo. Os clientes voltaram?
Não foi nada fácil recuperar a clientela e angariar novos clientes. O negócio esteve, de facto, parado durante muito tempo e os clientes habituais deixaram de passar por cá.Fui fazendo a clientela com o meu trabalho.

Já tem clientes habituais?
Tive, primeiro, uma cliente de Valadares que o marido veio cá engraxar os sapatos e gostou. Depois, essa senhora passou a ser minha cliente assídua e trazia vários pares de sapatos quando vinha a Espinho. Mas tenho um cliente, idoso, que sou eu que vou a casa dele buscar os sapatos para engraxar, porque ele tem grandes dificuldades em movimentar-se. Não lhe levo mais dinheiro por isso, porque compreendo a situação dele e gosto de ajudar. Basta ligar-lhe e dizer que é o Manuel Engraxador.

Entrevista disponível, na íntegra, na edição de 29 de dezembro de 2022. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por Dentro.