Armando Queirós nasceu em Espinho e foi criado pela avó e por uma tia.  Foi um dos fundadores da Central de Ferragens, negócio que dinamizou com mais três sócios e do qual é, atualmente, o único proprietário. Passou por um momento difícil, num período em que proliferaram as insolvências. Mas conseguiu-se levantar graças à sua resiliência e perseverança. Aos 73 anos gostaria de ver continuidade no seu negócio nas mãos do seu único funcionário. A Igreja e a religião bateram-lhe à porta e foi um dos braços-direitos do saudoso padre Manuel Henriques.

É um espinhense de gema!…

Nasci em 1951 no primeiro hospital de Espinho, que ficava na rua 8, num edifício que também já foi a sede do Partido Comunista Português.

Fui criado pela minha avó e por uma tia. A minha avó trabalhava no café Gil que ficava na avenida 8 e onde agora está o Casino Espinho. Fui criado por lá. A minha tia, Ilda Mano Queirós, acabou por ser minha mãe. Ela já tinha cinco filhos e ficou comigo. Eram tempos complicados que exigiam muito trabalho.

A vida era difícil!…

Era sim, mas também era muito saudável. Não nos faltava o essencial porque tínhamos comida na mesa, apesar de sermos muitos em casa da minha tia. Os tempos eram diferentes e não havia a estrutura que existe atualmente, nem os apoios sociais que há agora. As pessoas viviam do trabalho e não contavam com subsídios, como acontece na atualidade.

Começou a trabalhar muito cedo?

Saía da escola da Feira e vinha pela rua 19 até ao café Gil. Com 7 anos já gostava de trabalhar. Os donos do café colocavam uma estrutura de madeira no chão para que chegasse ao balcão para encher os açucareiros, porque o açúcar, nessa altura, não era embalado em pequenos pacotes como acontece atualmente nos cafés. Era o enchedor dos açucareiros.

Sentia-se feliz?

Gostava de trabalhar e, por isso, sentia uma alegria imensa por estar a fazer aquele trabalho. Lembro-me que a porta do café era muito larga e tinha, à frente, a máquina dos gelados. Os cafés, antigamente, eram enormes, amplos e majestosos. É essa imagem que guardo.

O café Gil ficava muito próximo do mar e no verão ia para a praia e aparecia todo encharcado junto da minha avó.

Foi o seu primeiro emprego?

O meu primeiro emprego, após terminar a escola primária, foi num barbeiro. Trabalhei no Salão Azul que ficava na rua 23, em frente ao Cine-Teatro S. Pedro. Escovava os clientes para lhes tirar os cabelos da roupa, para depois receber uma gorjeta. Mais tarde, aprendi a fazer a barba com os vareiros que iam ao barbeiro e que não pagavam. Um dia, fiz um pequeno corte na cara de um deles e nunca mais lá apareceu. Acabei por sair da barbearia porque era um jovem muito ativo e perspicaz. O proprietário da papelaria Livrália falou com o meu tio e fui trabalhar para lá. Mais tarde ele fundou a papelaria ABC que era um pouco mais acima da localização atual, na rua 19.

O que fazia com o dinheiro que ganhava?

Enquanto estava na barbearia, ia com o meu primo José Manuel à confeitaria Sameirinho comprar sortido de bolos. Era um luxo!

Esteve sempre por cá?

Não, aos 15 anos fui para Inglaterra ter com a minha madrinha à procura de uma vida melhor. A minha madrinha estava em casa de uma judia alemã. Era uma casa sumptuosa, enorme, onde nada faltava. Andei a estudar em Piccadilly e até cheguei a perder-me no metro de Londres. Memorizei a frase “I’m lost, please help me” e a polícia lá me encaminhou para casa.

Andava a estudar e também trabalhava nas limpezas.

Quando regressa para Espinho?

A minha madrinha acabou por falecer com um tumor na cabeça e tive de regressar para Portugal. Fui trabalhar para o Caneiro, que tinha uma oficina de moldes. Era o varredor da oficina e polia os moldes que iam para a fábrica Hércules. Ganhava muito pouco.

Morávamos na rua 15, nas traseiras do Palacete da Rosa Pena, numas casitas que haviam por ali. Entretanto, o António Gil era contabilista na Casa Sobral, como conhecia a minha avó e sabia que trabalhava das 6h00 às 23h00, perguntou-lhe se queria que eu fosse trabalhar para lá. Curiosamente fui substituir o Manuel Oliveira, da Pá Velha, que foi para a tropa.

Acabou por sair do Sobral!

Fui cumprir o serviço militar obrigatório na Marinha. Tinha uma tia, a Florinda, que morava na Parede com 14 filhos. Fui para lá com um outro primo, o Brito. A minha tia era maravilhosa porque recebeu, também, o meu primo José Manuel que também tinha ido para a Marinha. Éramos 17 ‘filhos’! Mais tarde fui para a Guiné e regressei a Espinho para trabalhar, novamente, na Casa Sobral.

Quando começou a entrar no ramo dos negócios?

Com o Martins, que acabou por ser meu sócio na Central de Ferragens. Começámos a vender materiais de construção que não colidiam com o nosso trabalho. Tinha casado e morava no Juncal, na rua do Tanque. Só tinha o meu quarto e a cozinha montados e a sala estava vazia para colocar lá o material para vendermos. Íamos às 6h30 ao J. Pinto Leitão, na rua do Bonjardim, no Porto, buscar as fórmicas para as vendermos aos carpinteiros que iam ao Sobral. Foi desta forma que começou a nossa vida comercial.

Artigo completo na edição de 28 de dezembro de 2023. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro por apenas 32,5€.