Há um provérbio oriental que diz que “homens fortes criam tempos fáceis e tempos fáceis geram homens fracos, mas homens fracos criam tempos difíceis e tempos difíceis geram homens fortes”.
Um sábio ditado que vem vindo a ser evidenciado nas nossas sociedades, dos tempos fáceis que foram alcançados, eliminando dificuldades e perspectivas e expectativas da franca acessibilidade a um sem fim de amenidades sem grande dificuldade, que se têm traduzido em dificuldades de conseguimento, de frustrações e de inconsequência de uns e de outros na capacidade de superação e de resiliência perante situações de maior dificuldade, temos vindo a regredir na preparação das gerações para as situações adversas que sempre o mundo contém.
Cinquenta anos depois de Abril, traduzido num primeiro período de vanguardismo e de aceleração de conquistas materiais e sociais que se seguiram, identificando um segundo período de promessas e expectativas incumpridas.
Uma mudança social transversal de sociedades no mundo ocidental dado pela aceleração da informação e do conhecimento e de uma horizontalidade de governação. Em todo o caso, talvez uma perda que se possa referenciar, com impacto significativo das lideranças e das elites das nações.
Dir-se-ia que em vários momentos e etapas das nações, em períodos e gerações existiriam perspectivas e direcções de acção, que as lideranças e as elites dinamizavam e corporizavam, orientando e estimulando a acção colectiva que inspiravam os agentes políticos num rumo, ou rumos alternativos de disputa política.
“Que um fraco Rei faz fraca a forte gente.” Assim escreveu Luís Vaz de Camões.
As lideranças contemporâneas são hoje distintas e diferentes adaptadas a novas realidades. O que poderíamos supor das propostas políticas de visão e de alcance de um futuro colectivo para as comunidades políticas das nações e das regiões políticas e económicas, tem sido transposto não por líderes, mas por gestores. Gestores de sensibilidades que governam por afinidades dos destinatários das acções e das políticas, contrários a rupturas e a reformas, e dispostos a massas informes de adaptabilidade de políticas e de soluções de agradabilidade a grupos vocais.
Caminhos sem rumo, sem perspectiva, sem energia, sem meta, sem estímulo, sem nada no horizonte.
Caminhos de facilidades como se não houvessem dificuldades e muitas superações a fazer. Que o preparo do melhor futuro, tanto implica medidas que são elas mesmo no presente impopulares e contrárias à vontade de quem é “governado”.
Tanto mais importante, porquanto as lideranças e as elites não têm sido capazes de gerar os estímulos sociais, culturais, económicos e de inovação que orientem a dinâmica de progresso da sociedade. Vendendo facilidades, criando expectativas, que não são concretizadas.
Uma verdade nas comunidades, nas nações e nos blocos políticos e económicos que partilhamos a nível europeu e internacional. Uma verdade que tanto mais é como no núcleo familiar. O que estamos a fazer para preparar as novas gerações para prosperar no mundo? Ou estamos a querer mudar o mundo para as novas gerações “impreparadas”?
O que temos experimentado nesta segunda parte dos pós 25 de Abril, nestes anos do novo milénio, na nossa comunidade política, económica, social, e cultural tem a expressão que temos vindo a sentir.
“Fado de um país que
se tem visto incapaz de
gerar as lideranças e
as elites fundamentais
para estimularem o
país, com projectos de
progresso e bem-estar
social consequentes, e
de forma alternativa,
quando os vigentes
não o estão a propor,
nem a garantir, nem a
alcançar.”
Nestes quase 25 anos deste novo milénio não temos feito nem preparado o país e as gerações para a sua verdadeira transformação e construção de uma sociedade resiliente, sustentável, inclusiva e próspera.
Um trajecto de empobrecimento, que os anos recentes não têm tido a capacidade de alterar de forma significativa: em 2000 éramos o 15.º país da União Europeia com um PIB per capita de 85% face à média Europeia, e em 2022 passamos para o 21.º país da União Europeia com um PIB per capita de 77% face à média Europeia.
A taxa de risco de pobreza, antes de qualquer transferência social era de 37,0% da população em 2000, e é de 41,8% em 2022, e a taxa de intensidade de pobreza aumentou de 22,0% para 25,6%.
Os trabalhadores qualificados perderam poder de compra entre 2000 e 2022, com perda de salário real neste período, cujos ganhos médios mensais dos profissionais altamente qualificados, quadros médios e quadros superiores tiveram perdas de 11 a 14%.
E com tantos desequilíbrios na sociedade que se verificam. O desequilíbrio das contas públicas que não está afastado, e tantas dificuldades em vários sectores sociais, em domínios como a saúde, a educação, a habitação, a justiça, os transportes, a segurança, entre tantas outras questões que oneram a capacidade de crescimento económico, como os elevados índices de custos de contexto e de carga fiscal insuportável, a falta de crença no país dos mais jovens, capazes e inovadores que desinvestem de Portugal.
Tudo isto sucede, tudo isto acontece, tudo isto é triste, tudo isto é fado. Fado de um país que não tem sabido fazer melhor. Fado de um país que teve todas as condições políticas e sociais ao longo destes anos neste novo milénio. Quatro maiorias absolutas, de um só partido, ou sustentadas em coligações ou acordos parlamentares, qua garantiriam as condições políticas, sociais, culturais para a realização das políticas necessárias ao país. Não há desculpas para tanto desperdício de condições.
Fado de um país que se tem visto incapaz de gerar as lideranças e as elites fundamentais para estimularem o país, com projectos de progresso e bem-estar social consequentes, e de forma alternativa, quando os vigentes não o estão a propor, nem a garantir, nem a alcançar.
Por tanto disto e por tanto de muito mais, não se pode ignorar o elefante na sala.
O elefante na sala são todos. Somos nós. Os portugueses! Descontentes com o “estado a que isto chegou”! Somos todos implicados. Mas não se espere que fique por aqui. Segundo a Lei de Murphy: “Qualquer coisa que possa correr mal, vai correr mal, no pior momento possível”.
O desequilíbrio que o país vive não está para mãos largas. A tentação de agradar a todos, de gerir sensibilidades e de responder com ofertas a todas as reivindicações de todos os sectores, o que fará, muito provavelmente, é contribuir para não resolver efectivamente qualquer situação e piorar o estado do desequilíbrio estrutural do país.
E tanto assim poderá ser, que gerará mais discórdia e contestação e o crescimento infindável do elefante da sala.
Outrossim, a gestão de sensibilidades e a capacidade de efectuar rupturas num contexto socialmente antagónico a rupturas e a medidas impopulares.
Muita atenção ao elefante na sala.
Escrito em desacordo ortográfico.
Tito Miguel Pereira
Consultor