Xadrez pós e pré-eleitoral

Foi apresentado o Orçamento do Estado e iniciou-se o mesmo jogo de todos os anos: quem irá dar a mão ao PS desta vez? Será que o orçamento é aprovado? Para adivinharmos isto, temos que olhar não só para o orçamento, mas também para o xadrez político pós-autárquicas porque um chumbo no orçamento poderia ditar eleições legislativas antecipadas. Portanto, a pergunta que devemos colocar é: quem ganha e quem perde com eleições antecipadas? Aquilo que está em causa não é apenas a votação do orçamento, mas também a possibilidade de haver eleições antecipadas caso o orçamento seja chumbado. Olhemos então para as opções partido a partido:

PS: Obviamente irá votar a favor do orçamento. No entanto, ironicamente, é um dos partidos que poderia ter algo a ganhar em eleições antecipadas caso o orçamento chumbe. Parece inevitável que o PS está em declínio e, se as eleições forem daqui a 2 anos, com outro líder do PSD é muito possível que o PS as perca. Se houvesse eleições antecipadas, o PS ainda apanharia a direita (PSD e CDS) em plena disputa interna com líderes contestados ou recentemente eleitos. Em eleições antecipadas, o PS apanharia PSD e CDS no seu momento mais fraco, apesar de alguns bons resultados autárquicos. O PS pode não querer arriscar ficar sem o controlo da bazuca, mas como boa parte já foi alocada e a probabilidade de se manter no poder com eleições antecipadas é alta, pode ser mesmo um bom cenário. Não se espera por isso que o PS faça demasiadas concessões para fazer aprovar o orçamento. Afinal, ironicamente, até poderia beneficiar se ele fosse chumbado e se abrisse uma crise política que resultasse em eleições antecipadas. Veredito: o PS votará a favor, mas estará pouco disponível para negociar de forma a garantir que não há crise política, porque até poderia beneficiar dela.

“NÃO SE ESPERA POR ISSO QUE O PS FAÇA DEMASIADAS CONCESSÕES PARA FAZER APROVAR O ORÇAMENTO. AFINAL, IRONICAMENTE, ATÉ PODERIA BENEFECIAR SE ELE FOSSE CHUMBADO E SE ABRISSE UMA CRISE POLÍTICA QUE RESULTASSE EM ELEIÇÕES ANTECIPADAS”

PSD: Um cenário de eleições antecipadas seria negativo para as aspirações do PSD. Do PSD, mas não de Rui Rio. Se é verdade que eleições antecipadas poderiam resultar num mau resultado para o PSD (ou pelo menos manter-se outra legislatura sem governar), também é verdade que poderiam ser a última hipótese de Rio liderar o seu partido numas eleições legislativas. Com o cenário de umas eleições à porta, dificilmente o PSD irá fazer uma troca de líderes. Até podia o congresso acontecer apenas depois dessas eleições antecipadas, dando a oportunidade a Rio de tentar ser primeiro-ministro pela segunda vez. Veredito: o PSD votará contra quase de certeza. Tem algum interesse em que haja eleições antecipadas.

CDU: O partido está em queda e teve umas más eleições autárquicas. Tem certamente esperança de recuperar até 2023, apesar de a tendência ser de queda há alguns anos. Eleições antecipadas neste momento garantem que irá continuar com dois grupos parlamentares, mesmo que mais pequenos. Em 2023, pode já não ter votação suficiente para eleger dois deputados do PEV, perdendo assim um grupo parlamentar. Ou então, pode recuperar e ter mais intenções de voto do que hoje, o que é certamente a esperança deles. Veredito: não desejará lançar uma crise política, mas também não se quer colar demasiado ao PS. Poderá votar a favor com algumas concessões que possa vender ao seu eleitorado como conquistas próprias. Não é certo que o PS esteja disponível para dar essas concessões.

BE: É o partido que menos deseja eleições antecipadas. Depois de um péssimo resultado autárquico e de más sondagens a nível nacional, irá fazer de tudo para que esta legislatura dure até 2023. Veredito: Fará um jogo de paciência com o PCP até ao fim, mas é muito provável que, se o PCP falhar e não aprovar o orçamento, o BE o fará, mesmo sem concessões relevantes do PS.

CDS: O CDS está numa grave crise interna e de intenções de voto. Eleições antecipadas poderiam ditar uma redução ainda maior do seu grupo parlamentar ou, num cenário mais extremo, mesmo o seu desaparecimento parlamentar (passando a deputado único ou mesmo nenhum). Certamente não deseja que haja eleições antecipadas, especialmente num cenário de guerra interna. No entanto, uma aprovação de um orçamento do PS seria mais um prego no seu caixão eleitoral. Veredito: irá chumbar o orçamento, mas rezar para que alguém o aprove de forma a ter dois anos para tentar a recuperação do seu eleitorado.

PAN: Situação semelhante à do BE. Está numa fase negativa e não deseja eleições antecipadas. Irá tentar algumas vitórias na discussão do orçamento com as quais possa agitar e mobilizar o seu eleitorado. Veredito: Se depender do PAN, o orçamento será aprovado com algumas concessões, mas é improvável que venha a depender.

Chega: Adoraria ter eleições antecipadas para aumentar de imediato o seu grupo parlamentar e o volume de subvenção estatal. Está estagnado nas sondagens há um ano, mas num patamar elevado. Isto significa que não espera grande crescimento no futuro e, principalmente, um crescimento que faça valer a pena abdicar já da subvenção estatal acrescida que receberia com os 300 mil votos que teria em eleições antecipadas, assim como do tempo adicional e assessores que resultariam de ter 15 deputados em vez de 1. Veredito: vai votar contra e rezar para que o orçamento chumbe e haja crise
política.

IL: Tem espaço para crescer nos próximos 2 anos, embora também beneficiasse dos recursos adicionais que as eleições antecipadas pudessem trazer. Veredito: já anunciou que votará contra.

Deputadas não inscritas: Muito provavelmente, perderão a sua posição de deputadas assim que haja novas eleições. Veredito: todos os incentivos para viabilizar o orçamento vendo medidas próprias aprovadas. Se depender delas, a aprovação do orçamento, certamente será aprovado.

Carlos Guimarães Pinto
Economista / Professor Universitário