Filha de comerciantes, nasceu em Espinho, em 1940 e foi professora primária na antiga escola da Idanha, durante 22 anos, até à altura em que se aposentou. Foi jogadora de voleibol do SC Espinho, onde conquistou três títulos de campeão nacional no início dos anos 60 do século passado. Astrid Vitó tem alma benfiquista e um amor ao SC Espinho. Conheceu Carlos Padrão no antigo Colégio de S. Luiz e casou com ele aos 23 anos. É mãe de dois filhos, Nuno, o mais novo e Filipe, o antigo jogador internacional de voleibol.

Espinhense de gema!…
O meu pai [Filipe Vitó] era comerciante, tinha uma ótica e vários estabelecimentos comerciais. O meu irmão, Romeu, ficou com os estabelecimentos do meu pai e dedicou-se ao comércio. As lojas vendiam imensas coisas, até eletrodomésticos. O meu pai foi a Lisboa para fazer um curso de maneira a poder ter uma ótica. Ele fez essa especialização para poder vender óculos. O meu pai cresceu no comércio por ele próprio e ganhou bastante prestígio. Até máquinas de costura ele vendia e, por isso, a minha mãe foi tirar um curso de corte e de bordados ao Porto para poder ensinar às meninas que comprassem as máquinas na loja do meu pai. Eu cresci neste ambiente.

Como foi o seu percurso na escola?
Andei na escola da rua 23 e fui, depois, para o Colégio de Nossa Senhora da Conceição porque ainda não havia em Espinho o Liceu. Fiz o antigo quinto ano e fui para o Colégio S. Luiz para completar o sexto e o sétimo ano, que correspondem ao 10.º e 11.º ano de agora. Foi no S. Luiz e no voleibol que conheci do meu marido, Carlos Padrão.

Como era a vila de Espinho desse tempo?
Gostava muito desta terra. Tinha uma avenida 8 que, no verão, era um verdadeiro espetáculo. Andávamos de um lado para o outro e, por isso, fazíamos ali longas caminhadas, todos os dias. Víamos o comboio a passar. Passávamos uns pelos outros e cumprimentávamo-nos. Era um espírito muito agradável e interessante. Havia cafés, esplanadas e música por todo o percurso.
Nas férias, a minha mãe atribuía-me algumas tarefas em casa, mas depois ia para a praia ou para a avenida. Gostava de ir à praia para tomar banho no mar e não era do meu agrado ficar a apanhar sol.
A avenida 8 estava completamente cheia, especialmente durante o verão. Nas esplanadas dos cafés tínhamos de pedir que alguém fosse tomar conta de uma mesa, para nos podermos sentar a conversar. O bocadinho da rua 23 até ao casino estava completamente cheio de gente. Tudo estava ali muito próximo, à beira do comboio. As pessoas consideravam que era mais fácil vir a Espinho de comboio do que ir, por exemplo, a Francelos. Gostava muito de Espinho dessa altura. Gostávamos de ver as roupas que as pessoas vestiam para entrarem no casino. Era uma vida mais simples. As raparigas não ficavam na rua até tão tarde.

Quais eram os vossos divertimentos?
Havia o cinema no Cine Teatro S. Pedro, que era muito mais barato no verão. Mas acompanhávamos muito o desporto, no rinque na beira-mar, com o hóquei em patins e com o voleibol. Algumas vezes o vólei era jogado no campo de futebol da Avenida, que era em terra batida. O desporto era praticado ao ar livre porque não havia pavilhões.

Como começou a jogar voleibol?
O meu pai era um ferrenho adepto do SC Espinho. A minha mãe não queria que eu fosse jogar, mas ele sempre me incentivou. Não me recordo se foi a Tanda ou o Carlos Ferreira que me falaram para ir jogar voleibol! Sei que começámos a aparecer no campo de voleibol e o nosso primeiro treinador foi o Adalberto Bodas. Treinávamos de manhã. O grupo foi-se formando e tornando cada vez mais forte. Convivíamos umas com as outras e o desporto fazia-nos muito bem. Quando comecei a jogar já tinha 17 anos. Os nossos jogos eram ao domingo de manhã. Tinha uma particular satisfação ao ganhar ao Leixões.

Teve alguma influência em si a famosa equipa de voleibol masculina do SC Espinho de 1957?
Teve uma influência enorme e foi o facto de terem sido campeões nacionais que estimulou a criação desta equipa feminina. Fomos campeãs nacionais durante três anos, dois títulos que conquistámos em Lisboa e um outro em Coimbra. Ganhávamos sempre ao Benfica, que era uma das melhores equipas. Não sei muito bem porquê, mas em Coimbra os estudantes estavam sempre do nosso lado. O SC Espinho foi a primeira equipa campeã nacional.

Recorda-se de algum episódio curioso desse tempo?
Tivemos de jogar em Coimbra, durante três dias. Vínhamos de lá cheias de fome porque não nos davam comida. Tínhamos de vir fazer as refeições a casa. A distância era curta, mas não era como é agora, pois demorávamos muito tempo a chegar a Espinho! Mas eramos todas muito amigas. Ainda hoje guardamos esta amizade, embora as colegas que eram do Porto se tenham afastado mais.

Conheceu o seu marido no Colégio de S. Luiz e no voleibol…
Um dia, o Carlos disse-me que queria falar comigo e pediu-me namoro. Foi na esplanada. Tudo às claras, como o meu pai exigia. Comecei a namorar aos 18 anos e aos 23 anos casámos. Ele tinha os jogos dele e eu tinha os meus e, por isso, ao fim de semana estávamos um pouco afastados um do outro. A nossa principal ocupação de tempos livres era o desporto e o voleibol. Acabámos por transmitir esta paixão pelo voleibol aos nossos filhos.

Tomava parte dos bailes que se realizavam antigamente?
Havia os bailes do voleibol. O dinheiro que se angariava sustentava a modalidade ao longo do ano. Participavam as pessoas que gostavam de voleibol e as suas famílias. Mas também vinha muita gente de fora! Realizavam-se na piscina e só terminavam às seis da manhã. Recordo-me que o meu marido, uma vez, saiu do baile e foi a casa tomar banho para ir trabalhar para o Porto.

A sua família (Vitó) sempre teve uma intensa participação na sociedade espinhense…
O meu marido é que tinha uma vida mais ativa nas associações. Eu tinha de ficar com os nossos filhos. O meu pai pertencia a várias associações, entre as quais os bombeiros, ao SC Espinho e ajudava a Académica de Espinho. Eu não tinha muito tempo para me dedicar às coletividades porque era professora primária. Deixava essa participação associativa para o Carlos Padrão.

Onde esteve a lecionar como professora?
Comecei a dar aulas, aos 20 anos, em S. Paio de Oleiros, na escola daquela freguesia, onde estive durante três anos. Saía de Espinho às 7 horas, apanhava o Vouguinha, para começar a dar aulas às 9 horas. Depois fui dar aulas para Silvalde, onde estive durante um ano, passando a efetiva em Gondosende, onde estive durante seis anos. Nessa altura, o meu sogro emprestava-me o carro para ir dar aulas. Depois fui dar aulas para a escola da Idanha onde permaneci ao longo de 22 anos. Nessa altura já estava mais perto de casa. Ainda hoje, alguns dos meus antigos alunos passam por mim, cumprimentam-me, mas não os reconheço porque já passou imenso tempo!
Sinto alguma nostalgia por ter acabado aquela escola. Os alunos agora vão para Guetim! Mas é certo que, com o decorrer do tempo houve cada vez menos crianças…

Era uma daquelas professoras, à moda antiga, que dava muitas reguadas?
Dava algumas reguadas de vez em quando, mas aquilo que mais doía aos rapazes era quando lhes retirava o recreio. Eles assim não podiam ir jogar futebol e isso servia-lhes de castigo. Não faziam os deveres e ficavam a estudar ao intervalo.

Acha que foi uma professora acarinhada?
Claro que sim. Naquele tempo havia muito mais respeito pelos professores do que o que existe atualmente. Ao ponto que chegamos! Baterem num professor!… É inconcebível. Nos tempos atuais não queria ser professora!

Houve algum grupo de alunos que tivesse marcado a sua carreira de professora?
Gostava de todos. Queria que eles estudassem e aprendessem. Tive alunos de todas as classes sociais e comigo portavam-se todos muito bem. Mas tive uma aluna que era de Castelo de Paiva e os rapazes tinham muito medo dela. Eles vinham fazer queixa que a Helena lhes tinha batido. Perguntei à Helena por que razão batia nos rapazes e ela respondia-me que o tinha feito para defender as raparigas mais novas, pois eles também lhes batiam. Essa rapariga era a defensora dos mais fracos.

Entrevista completa na edição de 24 de novembro de 2022. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro por apenas 32,5€.