José Manuel Bessa da Rocha, mais conhecido simplesmente por Bessa, é um dos artistas mais completos de Espinho. Desde o teatro à música, passando também pelas marionetas e a pintura, poucas são as artes que ainda não experimentou. Com 68 anos, diz agora querer descansar, mas não consegue deixar morrer as tradições da sua terra. Na sua casa, na freguesia de Anta, entre várias histórias de uma vida dedicada à cultura, ficámos a conhecer melhor um dos vultos mais famosos de Esmojães.
Não é natural de Espinho, como é que veio para Espinho?
Sou natural de Castelo de Paiva, mas vim para aqui na altura da escola primária. A família instalou-se aqui quando ainda era pequeno. Andava na segunda classe e por cá fiquei.
É bastante conhecido por ser um autodidata nos seus ofícios. Quando é que a arte apareceu na sua vida?
A arte apareceu na escola primária em Castelo de Paiva. Uma vez estava desatento a desenhar numa lousa uma figura de um livro, uma vaca num presépio, e a professora quando veio à minha beira ia certamente bater-me, mas quando viu o desenho ficou muito admirada e disse-me: “Foste tu que desenhaste isso? És capaz de desenhar isso num papel?”. Foi comprar-me uma folha para voltar a fazer o desenho e acabou por ficar em exposição na escola cerca de quinze anos. Ainda hoje, quando vou lá falam-me daquela vaca (risos). A partir daí percebi que tinha jeito e comecei a desenvolver a pintura. Nos primeiros tempos não tinha dinheiro para as tintas e tinha de fazer os relevos através dos sombreados. Mais tarde, quando já tinha o meu dinheiro, comecei a explorar mais a pintura, estudei, li vários livros, comecei a perceber como funcionavam as cores, a luz…
E o teatro quando é que apareceu?
Foi na altura do 25 de abril. Era e sempre fui operário, até que pouco antes da revolução saí da fábrica Corfi com a intenção de ir para uma fábrica de papel, que me tinha feito uma proposta melhor. Mas quando me despedi, no dia seguinte, deu-se a revolução e os patrões deixaram de empregar pessoas. Acabei por andar dois anos desempregado, até que comecei a fazer alguns trabalhos no Teatro Popular de Espinho. Fizeram-me um convite numa altura em eu até estava a estudar. Sabiam que desenhava bem e queriam que fosse fazer uns cenários. Eu andava no Coro Popular de Espinho e às vezes fazia uns desenhos para lá, quando íamos cantar as janeiras, por exemplo. Surgiu então o convite para fazer os cenários para um espetáculo sobre “O Retábulo das Maravilhas”, de Miguel de Cervantes. Eu fazia os desenhos, a carpintaria e também representava.
Falou que antes de ser convidado pelo Teatro Popular de Espinho estava a estudar. O que é que estudava?
Antigamente, existia o curso comercial e o industrial. Por azar andei naquele em que tinha menos jeito, o comercial, que tinha sido aconselhado ao meu pai. Sempre gostei de desenhar máquinas, por isso teria mais jeito no curso industrial, mas nunca mudei porque quando me apercebi disso já era tarde e ia perder alguns anos. Depois do 25 de abril fui para o liceu estudar línguas porque também pretendia desenvolver a escrita. Ainda hoje escrevo poesia, é outra das minhas paixões.
Durante a passagem pelo Teatro Popular de Espinho foi convidado por um grupo de teatro profissional…
Sim. Nessa altura uns indivíduos andavam à procura de pessoas para constituir um elenco e arrancarem com uma companhia em Évora. Eles não tinham tempo para andar a ensinar ninguém e por isso queriam alguém já com escola amadora. Quando vieram aqui perceberam que eu fazia tudo e convidaram-me.
Entrevista disponível, na íntegra, na edição de 09 de fevereiro de 2023. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro por apenas 32,5€.