A tradição perde-se e em Espinho não há quem faça reparações nos barcos

O mestre barqueiro Evangelista Gadelha, ainda trabalha na arte, aos 78 anos, mas não tem quem lhe suceda (fotografia: Francisco Azevedo)

A pesca e arte xávega são tradições seculares em Espinho. Na praia dos pescadores, os aprestos albergam as embarcações que, ao longo do ano, são fustigadas com a fúria das ondas. Estranhamente, por cá não há quem repare ou recupere os barcos. Os pescadores têm de se socorrer a mestres de outros concelhos.

Evangelista Loureiro (Gadelha) é natural da praia de Mira e é mestre barqueiro, um trabalho que abraçou desde muito novo e que herdou da sua família, com tradição secular na arte. Aos 78 anos, ainda trabalha naquilo que tanto gosta e veio a Espinho para recuperar o barco Rita e Carolina de Adelino Ribeiro, a única companha que ainda sobrevive, depois de o Vamos Andando, de José Barros (Zé Gordo), ter parado.

“Não sei muito bem há quantos anos a arte está no seio da minha família, mas, seguramente, está há cerca de dois séculos e, que conheça, já vamos na quarta geração”, conta à Defesa de Espinho o mestre Evangelista Loureiro. “Já o meu bisavô, o meu avô e o meu pai se dedicavam a esta arte de fazer barcos e de os reparar”, acrescenta com orgulho.

Apesar da idade, o mestre aparenta um ar jovem e é ele que comanda as tropas. Ajudado por dois dos seus filhos, ambos com outras profissões, Gadelha pega na serra e faz os cortes da madeira de pinho cuidadosamente escolhida por si na serração. São tábuas enormes e tudo é feito a olho pelo mestre. E tudo encaixa na perfeição.

“Os meus filhos têm os seus empregos e, aos fins de semana, ajudam-me a fazer as reparações dos barcos. Tenho pena que nenhum queira pegar nesta arte a tempo inteiro. Eles nasceram nisto e, por isso, já sabem muita coisa da profissão”, lamenta o mestre.

Quase nos 80 e com vontade de seguir

Evangelista olha para o barco e explica aos colaboradores como deverão colocar as tábuas. “Não temos plantas dos barcos e, por isso, tudo é feito a olho. Tenho tudo dentro da minha cabeça”, afirma o mestre dizendo que aprendeu com o avô e com o pai que tinham um estaleiro em Mira. “Segui os passos da minha família”, refere orgulhoso o mestre com quase 80 anos, acrescentando que eram sete filhos e só ele deu continuidade ao projeto, uma vez que os seus irmãos “não quiseram nada com isto”.

Aos 78 anos ainda tem força e vontade para continuar. “Não é um trabalho fácil e é muito complicado aprender. Por isso, os jovens não se interessam pela construção e reparação dos barcos”, afirma.

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