Polémica com a Patinhas sem Lar chegou à Assembleia Municipal

Um grupo de apoiantes da Patinhas sem Lar marcou presença na Assembleia Municipal (fotografia: Defesa de Espinho)

A responsável financeira e cofundadora da Associação Patinhas sem Lar, Ana Paula Castro, esteve ontem [29 de fevereiro] na Assembleia Municipal de Espinho, para dar conta da situação difícil que a instituição atravessa.

Usando o tempo para a intervenção do público, Ana Paula Castro leu um documento, dando conta de todo o trabalho que a Patinhas sem Lar tem vindo a fazer aos longo dos últimos anos.

Ana Paula Castro recordou o programa do Partido Socialista quando concorreu às últimas eleições autárquicas, que salientava que “a Patinhas sem Lar é uma associação sem fins lucrativos que tem assumido uma grande responsabilidade na proteção, acolhimento e adoção de animais do concelho de Espinho, funcionando num regime de voluntariado”, assumindo o compromisso da “melhoria das suas instalações” e de “garantir uma Câmara Municipal mais amiga dos animais”.

A cidadã espinhense lembrou, também, que neste programa eleitoral o PS propunha-se “avançar com um canil e gatil Municipal para recolha, acolhimento, esterilização e tratamento dos animais, organizar um Plano Municipal de adoção de animais com campanhas de sensibilização e adoção, através da oferta da vacinação, desparasitação e microchip dos animais adotados” e “criar um parque canino de partilha e fruição para animais e pessoas”.

A responsável pela Patinhas sem Lar explicou que a instituição “tem uma verba de quase 200 mil euros desde dezembro de 2022, destinada à construção de um abrigo canino e felino e está desde então a aguardar a cedência de um terreno em regime de comodato, para a construção do abrigo” e que corre o risco de “devolução deste montante, por incumprimento com o ICNF”.

Ana Paula Castro lembrou que as despesas e os gastos da Patinhas sem Lar em 2023 foram de cerca de 200 mil euros e que o apoio financeiro do Município “foi de 25 mil euros”.

“Temos que refletir se é isso que queremos de volta para a nossa cidade”, disse a responsável pela instituição reforçando que “a Patinhas sem Lar não tem os apoios necessários para a continuação da sua atividade em prol dos animais”.

“Ou o Município percebe que tem que ter uma parcela digna do seu orçamento anual destinada à proteção animal, ou vamos voltar aos tempos dos animais abandonados a deambular nas nossas ruas”, afirmou Ana Paula Castro, acrescentando que as dívidas às clínicas já estão em 24 mil euros. “Caso o Município mantenha o subsídio anual de 25 mil euros, ficamos já no mês de março sem possibilidade de acolher/tratar mais animais”, alertou.

“Espinho enfrenta vários problemas e o elevado número de animais errantes é um deles, como tal, não pode ser ignorado. É urgente encontrar soluções”, disse Ana Paula Castro acrescentando que “essas soluções não são imediatas, mas a médio prazo 80% dos problemas ficariam resolvidos com um investimento nas esterilizações de animais errantes, em particular felinos”.

“Se esta intervenção não for levada a cabo, para além das dezenas de pedidos de ajudas que continuarão a existir para tratar animais doentes, estes irão reproduzir-se com implicações na saúde pública e bem-estar da população”, concluiu.

Vice-presidente mostrou-se surpreendido, mas disposto a negociar

O vice-presidente da Câmara Municipal de Espinho, Luís Canelas, mostrou-se “surpreendido”, sobretudo, “com a agressividade” na intervenção da responsável pela Patinhas sem Lar. “Sempre tive uma relação cordial com a Associação Patinhas Sem Lar e tive sempre o meu telefone disponível”, referiu o autarca.

“Ninguém disse que a Câmara Municipal iria cortar subsídios a esta instituição e, inclusive, comprometemo-nos a subir o subsídio”, afirmou Luís Canelas, acrescentando que “no ano passado, esta associação foi informada do valor que iria receber no dia 1 de março”, evidenciou sublinhando o facto de que “esta foi a associação que viu a verba [das contrapartidas do jogo] mais reforçada”.

Por fim, Luís Canelas mostrou-se “disponível para conversar” e para “chegar a um entendimento”. No entanto, advertiu que, “para se chegar a um acordo terá de haver cedências de parte a parte”.

Presidente da Câmara não aceita “formas de pressão”

Na explicação que deu após a intervenção da responsável pela Patinhas sem Lar, a presidente da Câmara Municipal de Espinho, Maria Manuel Cruz lembrou que o Município de Espinho “custeia alimentação animal, castrações, vacinação, recolha de animais e seu tratamento em unidades médico-veterinárias” o que, “no ano de 2023, implicou um gasto direto, muito próximo dos 60 mil euros”.

“Para uma Câmara Municipal com fortíssimos constrangimentos orçamentais, este valor teria de ser já considerado importante. Porém, não são estas as únicas verbas direta ou indiretamente despendidas pelo Município para cumprimento das suas obrigações no que se refere à proteção animal”, salientou a autarca, explicando que em 2020 e 2021 foram entregues à associação, “no montante global, 27.500 euros” e que “este valor foi aumentado para 30 mil euros em 2022 e foi substancialmente aumentado em 2023 para o montante de 42.500 euros, acrescendo outras formas indiretas de apoio que não podem ser escamoteadas”.

Maria Manuel Cruz disse, ainda que a Patinhas sem Lar ocupa “um espaço de grande dimensão no edifício do antigo Matadouro Municipal onde a associação tem instalado o respetivo gatil, sem qualquer encargo para a Patinhas sem Lar” e que “o Município de Espinho sempre disponibilizou a essa associação meios de transporte para os animais que acolhe e cuida, estando um veículo do Município e respetivo motorista praticamente dedicado em exclusivo às atividades ligadas à causa animal”.

“Todas as formas de apoio indireto têm um valor económico inegável e fazem com que a ajuda direta ou indireta à associação ultrapasse, largamente, aqueles que são os compromissos do Município”, evidenciou a autarca.

Maria Manuel Cruz lembrou que “no protocolo de 2 de maio de 2023, o Município assumiu pagar a quantia de 25 mil euros, metade em abril e o restante em setembro de cada ano” e que a Câmara Municipal “cumpriu, escrupulosamente, o seu compromisso e continuará a fazê-lo”.

Por outro lado, segundo a autarca, “a associação comprometeu-se a realizar as atividades de recolha, tratamento médico veterinário, desparasitação e esterilização de animais errantes e abandonados e animais detidos por famílias de baixo rendimento residentes no concelho de Espinho sempre que haja vaga nos abrigos que detêm sob sua responsabilidade”, assim como “promover e assegurar a adoção de animais, realizar ações de sensibilização dos direitos dos animais na comunidade local”. Por isso, “a Patinhas sem Lar está vinculada às obrigações livremente assumidas até 2 de maio de 2024”, lembrou Maria Manuel Cruz garantindo que o Município “não deixará de honrar os compromissos para com todas as associações e coletividades”.

A autarca espinhense assegurou que “quando a primeira análise do exercício de 2023 estiver terminada, ainda no primeiro trimestre de 2024, dar-se-á conta à Patinhas sem Lar dos valores que poderão ser disponibilizados, sempre de acordo com a disponibilidade financeira do nosso Município”.

“Não posso aceitar as formas de pressão para que seja dada à associação um determinado valor. Tudo é negociável dentro do que é possível para o Município. Estamos dispostos a assumir sempre as nossas responsabilidades. O Município de Espinho sempre cumpriu com as suas atribuições e não posso deixar de lamentar que a Patinhas sem Lar ameace não cumprir as suas”, concluiu.

Associação responde à autarca

A Patinhas sem Lar já fez chegar à Câmara Municipal um esclarecimento sobre a intervenção da presidente na Assembleia Municipal de ontem [29 de fevereiro].

No documento, ao qual a Defesa de Espinho teve acesso, a associação refere que “seria importante esclarecer os cidadãos quantos animais foram tratados com esse montante [60 mil euros], e, após a alta, quem os recolheu, assumindo todas as despesas inerentes à manutenção dos mesmos até serem adotados”.

Nesse período, a Patinhas sem Lar “teve gastos com cuidados médico-veterinários num total de 136.633 euros (temos as faturas a comprová-lo, assim como o número de animais tratados)”, salienta.

A Patinhas sem Lar lembra que no espaço cedido pelo Município para o gatil, no edifício central do antigo matadouro municipal, a associação assumiu “todos os custos para ali alojar os gatos juniores e bebés”, pois “era um espaço devoluto e cheio de lixo”.

A Patinhas sem Lar considera lamentável que a Câmara diga que “não cobra renda pelo espaço do gatil, já que albergamos 100% dos gatos recolhidos no Município, substituindo-nos totalmente às obrigações do Município nesta área”.

A instituição refere que a autarquia apenas alimenta “os 15 cães que acolhe no canil municipal” e desafia a autarquia a “facultar as faturas relativas a estes gastos”. “A Patinhas sem Lar alimenta cerca de 200 cães e gatos” que alberga nos abrigos cujas despesas totais são de “17.471 euros em 2023” e ainda fazem “campanhas de angariação de ração para ajudar os cuidadores de colónias a alimentar as mesmas, assim como ajudamos famílias carenciadas sempre que nos solicitam ajuda para alimentar os seus animais”. “Gostaríamos de saber que fração do orçamento camarário é destinado a área”, desafia a associação.

A Patinhas sem Lar responde, também, ao vice-presidente da Câmara. “Está sempre disponível para atender ou devolver chamadas”, mas “o problema é a ineficácia na resolução de alguns problemas”, um dos quais “o subfinanciamento da Patinhas sem Lar, face ao crescente aumento dos pedidos de ajuda”.

“Quando terminamos 2023 com uma dívida de quase 15 mil euros, de imediato solicitei uma reunião com o vice-presidente. Dei-lhe a conhecer a tabela em anexo, e pedi a sua colaboração. Respondeu que iria falar com os serviços financeiros, e que essa verba seria inscrita no subsídio a atribuir em 2024. Em janeiro e fevereiro, continuamos a recolher e tratar animais, a dívida a escalar e os múltiplos contactos com o vice-presidente resultaram em nada”.

“Em todos os anos anteriores, incluindo no ano que Miguel Reis assumiu a presidência, fomos informados no fim do ano civil anterior, qual a verba a ser atribuída em sede de subsídio. A única verba que cujo montante era transmitido mais tardiamente era a da verba do Turismo. Mesmo com o protocolo sendo assinado mais tardiamente, sabíamos com o que nos governávamos”, revela.