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Há momentos em que temos que nos lembrar do que já alcançámos, quanto mais não seja para saber onde estamos e não esquecer de onde partimos. Sublinhando que nada está conquistado, que isto da democracia é um constante processo: de solidificação, de melhoria, de defesa. Vamos ao exercício de enumerar 50 coisas alcançadas (ao calhas, sem ordem cronológica ou de outra índole) e que apesar de tudo – muitos de nós gostávamos de não perder:

  • Serviço Nacional de Saúde
  • Educação universal e gratuita até ao ensino secundário
  • Mulheres no ensino superior
  • Liberdade de expressão
  • Melhores condições de habitabilidade
  • Salário Mínimo Nacional
  • Subsídio de Desemprego
  • Fim da guerra
  • Independência das colónias
  • Direito ao voto alargado a mulheres sem ensino secundário
  • Direito à greve
  • Auto-estradas de ligação do interior ao litoral
  • Sistema pluripartidário
  • Eleições livres
  • Manuais escolares gratuitos
  • 40 horas de trabalho com dois dias de descanso
  • Fim dos presos políticos
  • Mulheres com acesso a qualquer carreira
  • Católicos com direito ao divórcio
  • Direito de associação e de constituição de comissões de trabalhadores
  • Liberdade de imprensa
  • Um dos melhores países em matéria de sustentabilidade e combate às alterações climáticas
  • Rendimento Social de Inserção
  • Garantia de direitos à classe trabalhadora
  • Mulheres podem viajar sozinhas, sem autorização de ninguém
  • Fim do serviço militar obrigatório
  • Transportes públicos gratuitos para estudantes
  • Laicidade do Estado
  • Lei da eutanásia
  • Direito ao aborto
  • Nacionalizações em setores essenciais
  • Aposta no transporte público e gratuidade para os jovens
  • Complemento solidário para idosos
  • Casamento homossexual
  • Adoção por casais homossexuais
  • Direito à autodeterminação da identidade de género
  • Consagração da discriminação racial como crime
  • Adesão à União Europeia e livre circulação de pessoas
  • Garantia de reforma
  • Legalização do consumo de drogas
  • Direitos dos migrantes equivalente aos dos portugueses
  • Licenças de parentalidade
  • Bolsas de estudo
  • Proteção das vítimas de violência doméstica
  • Salário mínimo
  • Comissões de Proteção de Crianças e Jovens
  • Fim do lápis azul
  • Creches gratuitas
  • Criminalização das “práticas de conversão
  • Democracia e liberdade

Na cerimónia que assinala os 50 anos do 25 de Abril, se as pessoas forem coerentes (quem acredita?), vamos ter 50 lugares vazios na Assembleia da República. Espero que sim. E mais um: o de Augusto Santos Silva que, apontemos todos os defeitos e incongruências, enquanto ali esteve defendeu, como poucos, os valores que fomos conquistando a partir de 1974. Haverá quem acredite precisamente no contrário, que deu maior visibilidade e força aos fachos. Pois, então, que nos ensinem, essas vozes, como se combate a ignorância, o racismo, a discriminação, e a total falta de noção e respeito. Santos Silva tentou, temos que continuar a tentar.

Olhando para esta lista tão frágil, vejamos o copo meio cheio. Em 50 anos do 25 de Abril, o país vive com (pelo menos) 50 motivos de orgulho e com umas exatas 50, não lhes chamemos derrotas, mas falhas. Nesta equação, metade são conquistas que não podemos dar por garantidas, que temos que continuar a fortalecer. A outra metade, 50 lutas que não podem esmorecer. Para que outra maré cheia venha da maré vaza.

Cláudia Brandão
Jornalista