Tomás Sousa nasceu em Espinho e praticou, simultaneamente, as modalidades de andebol e de voleibol no SC Espinho. Foi no vólei que alcançou o sucesso, com dois títulos nacionais, ao serviço dos tigres, onde esteve 19 épocas consecutivas. Foi treinador-adjunto de Wladislaw Kustra, terminando a carreira de jogador quase aos 50 anos, no CD Fiães, onde se sagrou campeão nacional da 3.ª Divisão. O maior desgosto foi uma derrota ante o Benfica e a maior alegria a passagem numa eliminatória da Taça das Taças.
É natural de Espinho…
Nasci numa casa que ficava na esquina das ruas 18 e 19, onde eram os Coutos, há pouco tempo. Era aí o estabelecimento do meu pai e foi onde nasceram o meu irmão e a minha irmã. Fazíamos diferença de cinco anos entre nós, sendo eu o mais novo dos três.
Como viveu Espinho noutros tempos?
Comecei a viver em Espinho no local onde nasci. A casa era do meu pai e ele tinha lá um estabelecimento de venda de fazendas e de tecidos. O meu pai faleceu quando eu tinha quatro anos e a minha mãe conseguiu aguentar ali algum tempo, durante uns 10 ou 12 anos. Lembro-me que jogávamos à bola, à malha e ao peão, num local onde agora está a loja dos correios. Quando vinham os carros tínhamos de sair da rua.
Andei na primária na Escola da Feira e recordo-me que, nessa altura, havia competições desportivas com a escola da Tourada. Na zona do atual Parque João de Deus, havia lá o parque de campismo e o SC Espinho, em seniores, chegou a fazer ali jogos de voleibol. Era também aí que fazíamos os campeonatos entre as duas escolas. No final, distribuíam sêmea com figos. Ficávamos satisfeitos e felizes. Era o prémio que recebíamos. Foi nessa altura e dessa forma que começou a minha atividade desportiva. No final da escola primária, fui para o seminário onde estudei até ao antigo quinto ano.
Significa que andou a estudar para padre?
Não andei a estudar para padre, mas foi uma consequência das circunstâncias daquele tempo. A vida, na altura, era bastante difícil. A minha mãe era doméstica e, quando o meu pai faleceu, ela ficou com três crianças para criar, sem ter grandes recursos financeiros. Passámos por muitas dificuldades. Como não tinha possibilidades para aguentar a loja que era do meu pai, teve de a passar. Na altura, quem não tinha possibilidades para estudar tinha de se desenrascar e foi isso que fizemos. Como a minha família sempre foi muito ligada à igreja, um dos caminhos seria enveredar pelo seminário. O meu irmão, Rolando, já tinha ido para lá e eu não fui exceção, tendo lá estado dos 11 aos 15 anos de idade. No quinto ano tive de sair porque não me adaptei àquilo. Não era o que queria, nem a minha vocação. Tive lá coisas muito boas, mas também tive coisas muito más, algumas recordações que não me deixam saudades, nomeadamente no que diz respeito a disciplina. Contudo, reconheço que recebi alguma formação que ainda hoje me é muito útil e que teve muita influência no meu futuro.
O que fez daí em diante?
Tinha cerca de 15 anos e senti que tinha de continuar a estudar. Fui para o Colégio de S. Luiz, mas tive de frequentar um ano de transição do seminário porque não me davam equivalência. Fiz o quinto ano do liceu. Os exames foram no antigo Liceu D. Manuel II, atualmente a Escola Rodrigues de Freitas, no Porto. Fiz, também, a minha formação para ser professor primário. Era um curso mais acessível e que demorava menos tempo. Quem ia para a universidade, nessa altura, era quem tinha condições económicas e eu não as tinha. O marido da Maria de Lurdes, filha do proprietário da fábrica Hércules, que frequentava a minha casa, perguntou-me qual era a minha média e disse-me que entraria no Instituto Industrial do Porto. Foi isso que fiz e formei-me em engenheiro técnico. Aos 19 anos, não podia ficar sem trabalhar porque os meus irmãos fizeram um sacrifício enorme para eu poder estudar. Tive de ir para a tropa e ninguém empregava alguém que ainda não tivesse cumprido o serviço militar. Nessa altura, escrevi cartas para quatro escolas porque sabia que não havia professores suficientes. Fui admitido como professor provisório, em Chaves. Fiz a minha mala, como a dos emigrantes que vão para França e meti-me no comboio. Dei aulas em Chaves durante um ano e, no ano seguinte, consegui transferência para uma escola em Ovar, onde estive durante mais um ano. Em 1969 fui chamado para tropa, onde andei durante 39 meses, 33 dos quais foram passados em Aveiro. Não fui para o ultramar por acaso! Fui dos melhores classificados e, por isso, escapei a esse drama da altura. Acredito que foi o 25 de Abril que me livrou de ir para a guerra e acabei por sair da tropa como capitão miliciano.
Fim da tropa e…
Tinha de arranjar emprego, novamente, porque não poderia ser sustentado pelos meus irmãos. Fui trabalhar para a CETAP, onde estive durante 14 anos, até 1986. Nessa altura, mudei para a Cinca, onde trabalhei até me reformar.
Como iniciou a sua atividade desportiva competitiva?
Em Espinho era o voleibol que dominava. O SC Espinho tinha sido campeão nacional em 1957, em 1959 e em 1961. Era uma criança, nessa altura, mas ia ver os jogos ao rinque. Lembro-me de um jogo com o Instituto Superior Técnico que começou às 23 horas e que terminou depois das duas da madrugada. Em 1962 fui inscrito como aspirante no SC Espinho e comecei a jogar voleibol no clube. Como andava no Colégio de S. Luiz, o Chico Barbosa, que foi um dinamizador enorme do andebol em Espinho, convenceu-me a jogar na equipa dele em jogos contra a Escola Industrial, que tinha uma equipa com treinos e era bem organizada. Ganhámos o jogo. Tive sempre habilidade para o desporto e o Chico, no final, perguntou-me se queria jogar andebol. Lá aceitei, estando, em simultâneo a jogar voleibol. Pratiquei simultaneamente as duas modalidades cerca de 13 anos. Terminava o jogo de andebol e ia jogar voleibol, o que era algo impensável nos tempos atuais. Cheguei a ser convocado para a seleção do Porto de andebol.
Entrevista completa na edição de 29 de setembro de 2022. Assine o jornal que lhe mostra Espinho por dentro por apenas 32,5€.