Ainda vamos a tempo da fé? Seja qual for o entendimento que fazemos dela?

É a grande questão que certamente deve passar, muitas vezes, em “loop” na cabeça de cada um de nós. Para esta pergunta nem sempre temos resposta imediata ou plausível, neste mundo tão rápido em que vivemos.

O mais surpreendente, é que de forma automática atribuímos toda esta falta de atenção e descuido pelo nosso próprio eu e pelos outros, pelo facto de termos tantas e novas tecnologias ao nosso redor e que, ao responder por nós condicionam a nossa vida e maneira de ver as coisas.

Porém, a pergunta que devemos fazer é bem mais profunda do que a simples desculpa “dos novos tempos tecnológicos”. Convido-o, caro leitor a refletir e a pensar, para além do óbvio. Pensando pela nossa cabeça, refletindo sem ferramentas digitais, um minutinho que seja.

Com todas as inquietações que me assaltam o pensamento, quis pesquisar mais acerca da fé, aquilo que ela é e significa para cada um de nós. De imediato, apercebi-me que é uma resposta pouco objetiva, depende de cada um e da forma de fazer essa reflexão.

É curioso, ver, como atuamos na vida e na sociedade, enquanto indivíduos. Supostamente, em Portugal, vivemos num estado laico. Mas à primeira coisa menos boa que nos acontece, enchemos o pensamento de Deus, seja ele o que for para cada um. Deus me valha, Deus me ajude e acuda. Deus vezes e vezes, sem conta, como um bombeiro corre numa aflição.

Costuma-se dizer que os nossos problemas vistos de dentro, são gigantes e que esses mesmos contratempos, vistos pelos outros, de fora, não passam de uma gota no oceano, um ponto, no universo. Decididamente somos, não só seres de extremos, como também estranhos, no mínimo.

E porque será?

Tanto proclamamos a fé, mas pouco a praticamos no nosso dia. Tanto evocamos essa entidade maior, como de repente, tratamos os outros como se fossem meras peças de um tabuleiro de xadrez. Sem contemplações e num egoísmo coletivo dos tempos modernos.

Nesse sentido, é imperativo questionar se vamos, verdadeiramente, a tempo da fé, não como religião, mas como fé e pensamento solidário para com os outros e o mundo que nos rodeia. Digo-o no verdadeiro sentido de missão e filosofia de vida. Numa perspetiva de introspeção constante.

Mas, afinal o que é isto da fé?

O psicólogo e psicanalista Sigmund Freud, defendia que a fé no cérebro humano, desencadeia um mecanismo semelhante ao sentimento de proteção de uma criança perante a presença da figura paternal. Há, por isso, uma comparação direta entre Deus e a figura paternal que é palpável e admirada por tantos que experienciam esse sentimento. Por outro lado, esta necessidade de acreditar em algo transcendente, no entendimento de Freud, pode igualmente representar uma série de carências emocionais.

Em ambos o cenário, a tão proclamada fé, está sempre presente. No entanto, reparem que num tempo em que se fala tanto de expressar pensamentos, sentimentos e vontades, urge mais do que nunca, perguntarmos se vamos realmente a tempo de usar a fé em algo mais positivo e sorridente para todos.

Num tempo em que a raiva as guerras tantas vidas têm feito perder, a fé, essa realidade que afinal é tão desconhecida, mas também reclamada por todos, parece ser a única tábua de salvação para quase todos os males do mundo. O problema é que o princípio dessa evocação da fé perante os outros e na atitude de sociedade, bralha-se com religião e formulas de ritual coletivo. Ter fé é desde logo um diálogo interior.

Essa fé genuína, gera empatia e o amor ao próximo. Bem sei que são uns completos desconhecidos no coração de tantos, só assim se entendem tantas guerras. A única missão possível, é tentarmos fazer dos que nos rodeiam pessoas mais empáticas e com mais fé, com o que ela diz e representa para cada um.

Rita Bulhosa